Os debates só não têm sido mais intensos em função da neutralidade fiscal estabelecida pela Lei nº 11.941, de 2009, por meio do Regime Tributário de Transição (RTT), em relação aos critérios de reconhecimento de custos, despesas e receitas no resultado das pessoas jurídicas, instituídos pelo novo regime contábil. Em outras palavras, quanto a esse tema, prevaleceriam os critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007, a par do fato de as regulações promovidas pelas leis acima mencionadas não terem alterado substancialmente ou revogado dispositivos da legislação tributária.
Como é sabido, o "ágio" corresponde a uma parcela do custo de aquisição de investimento avaliado por equivalência patrimonial. Até pouco tempo, era calculado, seja para fins fiscais, ou para fins contábeis societários, mediante a contraposição do custo total incorrido e do valor patrimonial do investimento, sendo a parcela daquele excedente a este classificada como ágio, tudo conforme prescrito pelo Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, artigo 20.
Atualmente, sob o ponto de vista contábil societário, no caso de aquisição de participação em sociedade, vislumbrando-se relação de controle ou coligação entre investidora e investida, somente pode ser classificado como ágio o ativo que represente benefícios econômicos futuros resultantes de ativos adquiridos em combinação de negócios, os quais não possam ser individualmente identificados e separadamente reconhecidos (Pronunciamento CPC nº15).
Em tal situação, em termos quantitativos, o ágio corresponderá à parcela do custo incorrido excedente à parcela da investidora no "valor justo" dos ativos e passivos, reconhecidos ou não em balanço, da sociedade cuja participação esteja sendo adquirida.
Apesar de entendermos que o RTT não imuniza mudança nos critérios de quantificação do ágio, porquanto não se cuida de alteração de critério de reconhecimento de custo no resultado, fato é que o artigo 20 do Decreto-Lei nº 1.598 não sofreu qualquer alteração recente, continuando plenamente válido, vigente e eficaz, tal como o era em 31 de dezembro de 2007.
Queremos dizer com isso que, para fins fiscais, o ágio deve continuar sendo quantificado mediante a comparação entre o custo total incorrido e o valor patrimonial da participação adquirida. Ou seja, nessa situação, o valor a ser contraposto com o custo incorrido pela investidora, deverá corresponder, grosso modo, à sua participação no patrimônio líquido da investida, não havendo que se falar em avaliação a valor justo de todos os ativos e passivos desta última e nem necessidade de se levar em conta os itens não constantes em balanço.
Por mais nobres que sejam os objetivos das novas regras contábeis introduzidas pelos Pronunciamentos do CPC, estas não se sobrepõem a normas veiculadas por um instrumento com força de lei, como é o caso do Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, mesmo que consideremos que o Direito, quer por meio da Lei nº 6.404, de 1976, quer pela aprovação de autarquias ou órgãos reguladores, vem atribuindo normatividade a tais pronunciamentos. Trata-se de conclusão fundamentada no princípio de hierarquia das normas.
Não vamos tratar neste espaço da relação entre o assunto que estamos abordando e a fundamentação econômica do ágio à luz do novo regramento contábil, mas, independentemente disso, parece-nos precipitado afirmar-se que a quantificação desse (ágio), para fins fiscais, esteja absolutamente imune às novas regras contábeis. Isso porque o patrimônio líquido a ser utilizado como parâmetro, desde 1º de janeiro do ano corrente, está sujeito aos efeitos dessas novas regras, isto é, não é mais verificado de acordo com os padrões existentes em 31 de dezembro de 2007.