O ministro Guido Mantega (Fazenda) afirmou que os contribuintes não "perdem nada" com o atraso na devolução das restituições do IR, determinada pelo governo por causa da queda na arrecadação causada pela crise internacional.
"Este é um ano difícil, existe um ajuste na arrecadação. Faremos a restituição, só que demorará um pouco mais. O contribuinte não perde porque, se atrasar, está rendendo Selic", admitiu Mantega.
Conforme a Folha antecipou ontem, a Receita Federal deverá deixar de pagar R$ 3 bilhões em restituições devidas aos contribuintes neste ano. Dos R$ 15 bilhões que estavam programados para devolução, só R$ 12 bilhões serão depositados neste ano.
Não existe uma regra que obrigue o governo a pagar as restituições até dezembro. Todo ano, uma instrução normativa decide como será o cronograma de pagamentos. A prática é que os contribuintes recebam em lotes mensais entre junho e dezembro de cada ano.
A prioridade é dada a aposentados e depois a quem tem valores mais baixos a receber, pois são geralmente contribuintes com renda menor. Isso quer dizer que o adiamento deve atingir as pessoas que têm valores mais altos a receber e que demoraram a entregar as declarações, já que a Receita faz a devolução pela ordem de recebimento.
De acordo com a assessoria de imprensa da Receita Federal, se houver atraso no pagamento das restituições, será preciso uma nova instrução normativa alterando o calendário de pagamentos com a inclusão de novos lotes em 2010.
O argumento de Mantega de que não há perda para o contribuinte é verdadeiro se a pessoa não estiver endividada. Os juros pagos pelo governo correspondem à taxa Selic. Se o dinheiro for aplicado num fundo, a remuneração será mais baixa e, além disso, o rendimento será tributado pelo IR.
Mas, se o contribuinte tiver uma dívida e for usar o dinheiro da restituição para quitar o débito, quanto mais o governo demorar a pagar, maior será o prejuízo. É que os juros cobrados nos financiamentos são sempre mais altos que a Selic.
Mantega negou que o governo esteja usando "artificialismos" para aumentar o número de contribuintes que ficam retidos na malha fina e, com isso, reduzir ainda mais as despesas do governo federal.
Oposição critica
As declarações que ficam retidas na malha fina não são pagas no mesmo ano da entrega da declaração. Só depois que as pendências são resolvidas é que esses trabalhadores podem receber o saldo remanescente.
A oposição ao presidente Lula no Congresso reagiu ontem com críticas ao atraso no pagamento das restituições do IR. O líder do DEM na Câmara, deputado Ronaldo Caiado (GO), comparou a atitude ao confisco da poupança na época do ex-presidente Fernando Collor e classificou o ato como um golpe contra a classe média do país. "É uma maneira de confiscar, de assaltar o povo brasileiro."
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Para o líder do PSDB, deputado José Aníbal (SP), os atrasos nas restituições são fruto da desorganização do governo federal. "Eles não estão deixando de pagar às grandes empreiteiras, mas sim aos que contam com aquele dinheiro para pagar contas", afirmou.
O deputado Fernando Chucre (PSDB-SP) protocolou requerimento pedindo esclarecimentos a Mantega.
Ele quer saber, por exemplo, como o governo pretende agir com quem fez a antecipação da restituição em bancos, com o pagamento mensal de juros, e teve o seu caso postergado por conta dessa medida; e qual é o dispositivo legal para amparar essa decisão.
Em resposta às diversas críticas, o líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), foi à tribuna e disse que o "confisco da caderneta de poupança ocorreu em outros períodos no país, quando a oposição de hoje era governo".
Regras não são iguais para fisco e contribuintes
MARCOS CÉZARI
A queda na arrecadação tributária não é justificativa para o governo atrasar as restituições do IR aos contribuintes que têm esse direito.
Embora a lei dê à Receita o prazo de cinco anos para processar a declaração, as restituições não devem ser pagas com tanto atraso para os contribuintes que entregaram no prazo e prestaram as informações corretamente.
Para esses, a restituição deveria ser paga até dezembro do ano da entrega, dentro dos sete lotes normais (junho a dezembro). No ano seguinte deveriam ser pagas as restituições para os que ficaram retidos na malha fina.
Atrasar a restituição pode atrapalhar a vida de muita gente. É que, ao entregar o IR, o cidadão que tem restituição conta com o dinheiro de volta no mesmo ano. Muitos até recorrem a bancos, pagando juros acima dos da Selic, para antecipar um dinheiro na esperança de que o fisco pague-o logo.
Quando a restituição é paga, ela é corrigida a partir de maio do ano de entrega da declaração. Da mesma forma, quem tem IR a pagar e o faz em parcelas também paga com correção pela Selic.
O problema é que a Receita devolve o dinheiro apenas corrigido pela Selic, sem multa, mesmo quando atrasa a devolução -o que deverá ocorrer neste ano.
Mas a recíproca não é verdadeira. Imagine um contribuinte que perdeu o emprego ou que, por algum outro motivo, não tem condições de pagar em dia as parcelas do IR devido na declaração. Para o fisco, não interessa se a "receita mensal" do contribuinte ficou menor -ele quer a parte do leão e pronto.
Nesse caso, além da Selic, há multa de 0,33% ao dia, limitada a 20%. Resultado: quando atrasa, a Receita devolve menos; quando é o contribuinte que atrasa, tem de pagar mais.