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Benefícios levam a discussão sobre carga tributária

Com a redução do IPI, a arrecadação do país não caiu consideravelmente.

 

Aline Pinheiro

Um ano depois de a crise financeira ter se espalhado mundo afora, o Brasil começa a discutir se já não é hora de cortar os benefícios fiscais que foram dados como forma de manter o consumo e amenizar os efeitos da crise no país. O tema permeou o debate de encerramento do IX Congresso Internacional de Direito Tributário de Pernambuco, que aconteceu de 10 a 12 de setembro em Porto de Galinhas (PE). O debate foi mediado pelo apresentador da CBN Carlos Alberto Sardenberg.

José Múcio Monteiro Filho, ministro das Relações Institucionais do governo Lula, contou que, na última reunião do G20, a Alemanha e alguns países sugeriram a retirada dos incentivos fiscais, já que a crise, se não está superada, caminha para isso. O Brasil foi um dos que lideraram a defesa da manutenção dos benefícios, conta José Múcio. Ele reconheceu que o Brasil está saindo da crise, mas afirmou que, por um tempo ainda, os benefícios fiscais devem ser mantidos. O que não se pode fazer é deixar os benefícios virarem preço, ou seja, a redução de tributos ficar permanente, “porque aí acaba o incentivo ao consumo.”

A eficácia dos benefícios fiscais para incentivar o consumo e fazer o país não sofrer tanto em tempos de crise foi reconhecida pelo ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel. Para ele, como o IPI, principal alvo dos incentivos, já tem como estrutura alíquotas diferentes para cada produto, a desoneração de determinados setores não é uma surpresa e pode sim ser bastante eficaz. O problema, disse, é que o 57% da arrecadação com IPI vai para os estados e municípios. Portanto, foram eles os que mais sofreram. “Por que a redução não foi de Cofins?”, sugeriu. A resposta do governo veio de bate-pronto: a União se comprometeu a se sacrificar e manter igual à distribuição para estados e municípios, disse José Múcio. “Mas os estados e municípios foram ao mais vitimados sim”, reconheceu.

“Com a redução do IPI, a arrecadação do país não caiu consideravelmente. Por que não tornar a redução permanente para reduzir a carga tributária? Incentivo que deu certo pode virar permanente”, provocou Mary Elbe Queiroz, presidente do Instituto Pernambuco de Estudos Tributários (Ipet). A resposta veio, mais uma vez, dos representantes do governo. “Porque aí deixa de ser benefício”, disse José Múcio.

O procurador-geral da Fazenda Nacional, Luiz Inácio Lucena Adams, explicou que o benefício foi gerado por uma crise de crédito e mantido com sacrifícios, principalmente da União, que assumiu o ônus de financiar os municípios. “Temos de trabalhar uma solução estrutural para resolver o problema da carga tributária. Não podemos tratar solução pontual como estrutural.”

Hora de reformar

A tal falada mudança estrutural viria com a também bastante discutida e ainda tão distante reforma tributária. “Reforma tributária no país é igual o paraíso. Todo mundo quer chegar lá, mas não quer que chegue o dia de chegar lá”, brincou José Múcio. Ele afirmou que, para o governo, é importante que haja sim a reforma tributária, mas também reconheceu que ela não acontecerá nesse governo, que termina no final de 2010.

Há conflitos de interesses, disse. O principal deles é que todo mundo quer arrecadar mais e o contribuinte, pagar menos. Por conta destes impasses, disse José Múcio, o momento certo para discutir qualquer reforma é nos seis primeiros meses de governo. Mas o mais importante, disse, é a reforma política. Da maneira como funciona o sistema político no Brasil, basta um deputado para emperrar a votação de qualquer outra reforma.

Everaldo Maciel, que já esteve à frente da arrecadação de tributos da União, rebateu a principal bandeira de contribuintes que lutam pela reforma tributária: a redução da carga tributária. A carga é da altura dos gastos do país, que gasta muito com educação e saúde, por exemplo, disse. Mary Elbe não deixou barato: “Mas a gente não vê os gastos com educação e saúde”, disse e foi aplaudida pela plateia que assistia o debate. Everardo Maciel rebateu: É que o país historicamente gasta mal.

Para ele, o que mais afasta investimento estrangeiro no país não é a alta carga tributária, mas a peculiaridade do sistema tributário brasileiro. Aqui, todo assunto tributário se converte em discussão constitucional, o que não acontece em nenhum outro país. “Nosso problema é que tudo está na Constituição. Isso é resultado da falta de confiança no legislador ordinário”, afirmou João Otávio de Noronha, ministro do Superior Tribunal de Justiça.

Maciel lembrou que isso se torna mais grave dada a informação passada pelo ministro Gilmar Mendes de que o Supremo Tribunal Federal demora em média 14 anos para dar resposta em Recurso Extraordinário, ferramenta de controle difuso de constitucionalidade. Com as novas ferramentas como Repercussão Geral e Súmula Vinculante, no entanto, essa demora tende a ser reduzida.

País das contribuições

O ministro José Múcio foi questionado sobre a Contribuição Social para a Saúde (CSS), a filha da CPMF, e afirmou categoricamente: “A CSS não vem”. Segundo ele, um grupo pequeno na Câmara luta para aprovar a contribuição, mas o governo já desistiu e se colocou fora da discussão.

Everardo Maciel levantou um ponto que, caso a CSS passe pelo Congresso, pode levá-la a ser barrada no Judiciário. A CPMF foi imposta por meio de Emenda Constitucional. Já a CSS é discutida em Projeto de Lei Complementar. Para Maciel, como imposto sobre a movimentação financeira é cumulativo e a Constituição diz que lei complementar só pode tratar de imposto não cumulativo, a CSS nasceria de lei complementar já inconstitucional.

O procurador da Fazenda Adams reclamou da visão parcial da discussão. “Temos o hábito de tratar questões pelas partes e não ver o todo”, disse. Ele explicou que todos criticam a CSS, mas não enxergam que está havendo aumento dos gastos com a saúde e o Estado precisa gerar recursos para suprir isso. “O Brasil tem problemas na área de saúde sim, mas também tem o SUS estruturado para atender a população.”