O governo federal estuda a adoção de idade mínima para concessão de aposentadoria integral a trabalhadores do setor privado.
A proposta está em discussão nos ministérios da Fazenda e da Previdência e deve ser apresentada à presidente Dilma Rousseff em março.
Segundo a Folha apurou, a proposta mais forte hoje é 65 anos de idade para homens e 60 para mulheres, no caso dos segurados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), que atende aos trabalhadores do setor privado.
A mudança valeria apenas para quem ainda não entrou no mercado de trabalho.
Pelas discussões, a ideia é substituir, no futuro, o atual fator previdenciário -fórmula de cálculo do valor do benefício para desencorajar aposentadorias precoces, adotado a partir de 1999.
O fim do fator é uma demanda das centrais sindicais e tem apoio de alas petistas. Mas, como não há hoje idade mínima para aposentadorias em valor integral no setor privado, o Executivo alega não poder abrir mão de um instrumento que evite ampliação do deficit previdenciário.
Em 2010, a despesa com o INSS chegou perto de 7% do PIB e a 36% dos gastos da União, excluindo da conta os encargos da dívida pública.
O Palácio do Planalto foi informado sobre a elaboração da proposta e não desautorizou o debate. Segundo alguns interlocutores da presidente, Dilma irá fazer um cálculo político para decidir se leva o tema adiante.
O assunto é polêmico. Como a mudança seria somente para futuros trabalhadores, ministros argumentam que o embate seria menos amargo do que uma iniciativa que mexa em direitos atuais.
Na campanha eleitoral, a então candidata disse que não tocaria uma reforma da Previdência. Se patrocinar a medida, pode encontrar pela frente forte resistência das centrais, com as quais já se atritou na definição do salário mínimo de R$ 545.
"Acho que dá para discutir, mas a presidente não pode querer fazer imposições. Sem negociar, haverá confusão", disse à Folha o deputado Paulo Pereira da Silva, da Força Sindical.
Apesar de uma certa simpatia à causa, há na Esplanada quem aconselhe a presidente a não comprar brigas que não tragam dividendos políticos ou ganhos orçamentários imediatos.
Outros afirmam que o momento para mudanças é exatamente agora, no embalo do primeiro ano de mandato. A votação seria um teste real à governabilidade dilmista, e significa um obstáculo muito maior do que a votação do salário mínimo, aprovado com tranquilidade no Congresso.
Internamente, já se considera uma moeda de troca para conquistar a simpatia do mundo sindical à proposta da idade mínima: flexibilizar o fator previdenciário e estabelecer uma transição menos rígida até que a idade mínima entre em vigor.
O Planalto resgataria na Câmara o projeto do fator 85-95, que prevê o benefício integral aos trabalhadores cuja soma da idade e do tempo de contribuição resulte em 85 (mulheres) e 95 (homens). Exemplo: um homem com 35 anos de contribuição e 60 de idade obteria o direito à aposentadoria integral.
A instituição de uma idade mínima elevaria o prazo de contribuição ao regime geral da Previdência em 12 anos -hoje, um trabalhador pode requerer aposentadoria proporcional por tempo de contribuição aos 53 anos.
É provável, porém, que seja preciso preservar um mecanismo para a aposentadoria por tempo de contribuição, especialmente para os mais pobres, que ingressam mais cedo no mercado.
ANÁLISE REFORMA PREVIDENCIÁRIA
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Extinção do fator previdenciário é uma medida necessária
Mecanismo parte do pressuposto de que a pobreza dos aposentados abre caminho para o crescimento do país
ELIMINAÇÃO DO FATOR PERMITIRIA A RETOMADA DA RELAÇÃO ENTRE A CONTRIBUIÇÃO E O VALOR INICIAL DO BENEFÍCIO
Marcus Orione
O fator previdenciário é, como sabem quase todos os trabalhadores do setor privado que vislumbram a aposentadoria, uma fórmula complexa que resulta quase que invariavelmente na redução do valor do benefício.
Instituído no Brasil a partir de 1999, o fator previdenciário é uma criação brasileira, não contando com precedentes em nenhuma outra parte do mundo.
Em outros lugares, na verdade, tentou-se solucionar o problema da Previdência de outras formas, como o aumento das idades mínimas para a aposentadoria, por exemplo.
No entanto, ainda nesses casos, percebe-se a inutilidade de tais soluções. O problema hoje demanda uma análise muito mais complexa de questões como a revisão das fontes de custeio do sistema.
No caso brasileiro, com o estabelecimento do fator previdenciário, o governo buscou diminuir as contas públicas, em vista da redução promovida no pagamento de certos tipos de benefício.
Ao agir assim, partia do pressuposto -a nosso ver reducionista- de que, com a diminuição no pagamento das aposentadorias, haveria, como contrapartida, crescimento econômico -em vista da economia de bilhões para os seus cofres.
Trata-se de pressuposto que desconsidera a involução social criada pelo mecanismo, que admite o desenvolvimento econômico divorciado do social, na medida em que permite o incremento da situação de pobreza dos mais pobres como solução para suposto crescimento do país.
Para ilustrar o que se está mencionando, basta lembrar que o cidadão que vai se aposentar tem seu benefício diminuído, em média, 30% em relação ao valor da contribuição somente mediante a sua aplicação.
Não por acaso, no instante da concepção do fator, percebendo o seu efeito na vida dos trabalhadores, os partidos de oposição, inclusive o PT, foram bastante cautelosos quanto a sua admissão.
Isso é fácil de perceber. Desde que existe o fator previdenciário, quem quiser fazer jus a uma aposentadoria mais vantajosa deve estar disposto a contribuir longamente para o sistema e nele entrar muito jovem ou sair demasiado velho.
Isso porque, no cálculo do fator previdenciário, são considerados dados como idade e expectativa de vida.
A ideia básica é incentivar o trabalhador a atuar desde tenras idades e por um longo lapso de tempo.
A eventual extinção do fator previdenciário representa medida de justiça social, já que retoma a relação mais imediata entre contribuição e valor inicial de benefício.