Os empréstimos para empresas começam lentamente a se recuperar, acompanhando a reativação da economia, depois do mergulho do primeiro semestre. Mas a demanda por crédito pode não voltar ao ritmo que apresentava antes do agravamento da crise. "As empresas que já recuperaram faturamento estão operando com menos crédito", disse o vice-presidente do Banco Fibra, Maércio Soncini.
De fato, com a escassez de crédito, as empresas fizeram ajustes na gestão de estoques e aumentaram as negociações de prazos com fornecedores e clientes para melhorar o fluxo de recursos e reduzir a necessidade de financiamento bancário. A demanda, portanto, pode ser menor do que antes da crise, mesmo se o crescimento econômico voltar com mais força no ano que vem.
No auge da crise financeira, entre setembro e outubro, a Harald Indústria e Comércio de Alimentos Ltda., uma das principais produtoras de doces, confeitos e coberturas do país, de Santana de Parnaíba (SP), viu vários fornecedores internacionais, especialmente da Malásia, onde compra alguns tipos de gordura, cortarem o crédito e exigirem pagamentos a vista. Mas, os fornecedores locais não suspenderem a prática do pagamento em até 90 dias das encomendas de leite, açúcar e cacau, o que manteve o fôlego da empresa.
A própria Harald financia seus clientes, indústrias de doces, lojas de artigos de festa e distribuidores especializados. Agora, a oferta de recursos "melhorou bastante", disse o diretor comercial da Harald , Jacob Cremasco, "mas todos estão mais cuidadosos ao tomar crédito". A apreciação do real também barateou as importações de matéria-prima. Nos financiamentos aos clientes a inadimplência está baixa, informou.
Segundo um empresário da cadeia produtiva da indústria automobilística, a situação ainda não se normalizou. Sua metalúrgica teve que reduzir o volume de empréstimos que tomava em bancos por conta da alta das taxas e foi forçada a fazer ajustes internos para se adequar à nova realidade. O principal ajuste foi nos estoques. A companhia resolveu reduzir os estoques e, com isso, a necessidade de capital de giro.
O empresário disse que as taxas já caíram um pouco em relação ao pico, mas ainda estão longe dos níveis pré-crise. Na indústria automobilística, ele diz que o financiamento ao comprador final já voltou. Com isso, ele espera que o crédito para pessoa jurídica se normalize até o final do ano.
Outra empresa, do ramo de autopeças não quis nem crédito do BNDES, porque avalia que o custo está alto. Optou por trazer recursos da matriz, na Alemanha, e ainda se beneficiou do câmbio mais favorável. Com isso, diz seu diretor presidente, preferiu também liquidar alguns empréstimos locais a custos mais altos.
Roberto Souza, diretor financeiro da BorgWarner Brasil, fabricante de equipamentos para o setor automobilístico, diz que uma das soluções encontradas pela empresa para driblar a escassez de recursos e o custo mais alto do dinheiro foi trabalhar com com vários bancos. Ele diz que a oferta de crédito está aumentando e os bancos voltaram a procurar as empresas, coisa que não acontecia há muito tempo. Desde a piora da crise, eram as empresas que tinham que bater na porta dos bancos. "Mas as taxas ainda estão altas. Não estão no nível que gostaríamos."
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Os dados mais recentes do Banco Central, de julho, mostram que a média diária de concessão de crédito, ou seja, o montante de recursos que os bancos liberam para as empresas a cada dia, caiu 10% em relação ao mês anterior, saindo de R$ 4,6 bilhões para R$ 4,1 bilhões. Em relação ao patamar pré-crise, quando a média atingiu R$ 5 bilhões em setembro de 2008, o tombo é de 17,5%. O recuo é ainda maior entre as pequenas e médias.
Os bancos ainda se ressentem da inadimplência. Os atrasos acima de 90 dias atingiram 3,8% da carteira em julho, acumulando elevação de 2,2 pontos percentuais desde setembro do ano passado.
Por conta disso, o mercado está dividido entre as empresas com recursos abundantes e as companhias que sofreram mais com a crise e que não conseguem linhas de crédito. Isso fez com que os bancos passassem a disputar as mesmas empresas. "Do ponto de vista de bancos, é clara a vontade de conceder crédito, mas o mercado está menor e com a demanda mais fraca", resume Soncini.
O vice-presidente do Banco ABC Brasil, Gustavo Lanhoso, disse que o banco não teve problemas de funding, por conta da participação estrangeira no capital. Isso permitiu que a instituição ganhasse mercado no momento de retração dos outros bancos. "Mas os bancos que estavam mais retraídos estão voltando. Já estamos sentindo a maior concorrência", disse.
Alguns dados econômicos também já apresentam melhora e animam as instituições, lembra Osmar Roncolato Pinho, diretor do Bradesco. Entre eles está a recuperação do emprego e do setor de serviço, mas a indústria ainda demora um pouco mais para reagir. "O segundo semestre sempre é mais forte e nesse ano isso vai ficar ainda mais claro", disse.
Ede Viani, diretor do grupo Santander Brasil, lembra que as indústrias começam a demandar mais crédito para a produção do fim de ano e, em seguida, o comércio se prepara para as vendas de Natal.
Os bancos também preparam linhas específicas para oferecer recursos com mais garantias e condições mais favoráveis, como as antecipações para o 13º salário.
Com o recuo dos privados durante a crise, coube ao Banco do Brasil irrigar boa parte do mercado. "O primeiro trimestre teve uma demanda fraca pela contaminação dos últimos meses de 2008, mas no segundo trimestre a procura por crédito cresceu 35% e tem se mantido assim", disse Ari Joel, diretor de micro e pequenas empresas do banco estatal.