As lojas abarrotadas de gente nas vésperas de datas comemorativas como Dia das Mães sugerem: parece que nunca se vendeu tantos eletrodomésticos e eletroeletrônicos no Brasil quanto nos últimos cinco anos, mesmo considerando os efeitos negativos da crise internacional entre 2008 e 2009. Não por acaso, isso aconteceu exatamente no período em que 26 milhões de brasileiros ascenderam à classe C. Mas, depois de abastecerem as casas com os mais variados bens duráveis – de geladeiras com compartimento de água na porta a modernos televisores –, esses consumidores descobriram que sua situação financeira também já permite cuidar melhor da aparência, jantar ou almoçar fora de vez em quando e até viajar para lugares mais distantes.
A "nova classe média" percebeu que os serviços também fazem parte da ideia de uma vida confortável e faz esforço para poder usufruir deles. "Vale destacar que o que é considerado supérfluo pelas classes A e B nem sempre é visto da mesma forma por esse novo consumidor. Para ele, supérfluo é poupar: se tiver dinheiro sobrando para guardar significa que já conseguiu comprar boa parte das coisas que gostaria de ter", afirma o sócio-diretor do instituto de pesquisa Data Popular, Renato Meirelles. "Assim, produtos e serviços que podem parecer supérfluos à primeira vista são considerados necessários por essas pessoas", diz.
Aparência – À parte dessa discussão sobre o conceito de supérfluo, o fato é que diversas pesquisas verificaram que o consumidor de renda média se preocupa e, muito, com itens que vão além do básico.
É o caso de um estudo feito pela agência McCann Erickson no ano passado, para o qual foram ouvidas famílias com renda mensal entre R$ 1 mil e R$ 2 mil. O trabalho mostrou que esses consumidores estão, por exemplo, mais preocupados com a aparência, inclusive os homens: 87% deles disseram investir em tratamentos para os dentes e 36% admitem fazer as unhas regularmente. Entre as mulheres, 86% frequentam salões de beleza – dessas, 66% gastam até R$ 30 em cada visita e 11% destinam mais de R$ 50 para esse pequeno luxo. O movimento no Shopping Metrô Itaquera, localizado na estação de metrô de mesmo nome, na zona leste da capital paulista, é um cenário perfeito para essas novas aspirações. Nos fins de semana, a praça de alimentação torna-se o lugar mais disputado do centro de compras, com famílias inteiras almoçando ou jantando juntas. "De 2008 para 2009, as vendas na praça de alimentação aumentaram 22%. Esse resultado prova que mais pessoas com renda intermediária estão optando por se alimentar fora de casa, como uma forma de lazer", diz o superintendente do shopping, Jonas Fortes.
De acordo com Nuno Fouto, diretor de Estudos e Pesquisas do Programa de Varejo (Provar) e professor da Universidade de São Paulo (USP), o aumento do consumo desses serviços é uma tendência observada em vários países, e ele ocorre não necessariamente pela sobra do orçamento.
Cruzeiros – As viagens, por exemplo, têm conquistado lugar de destaque na lista de desejos. Pesquisa do Ministério do Turismo mostrou que subiu de 32,4% para 58,8% no período de 2005 e 2007 para 2008 e 2009, o número de brasileiros que fizeram ao menos uma viagem no País a lazer no ano. Mais de um terço desse total, (35,5%), tinha renda média familiar de até cinco mínimos.
"Depois da troca da geladeira e do fogão, a viagem com a família é o novo sonho possível do brasileiro", afirma Guilherme Paulus, presidente do Conselho de Administração da CVC. A operadora oferece pacotes a partir de R$ 500 por pessoa, que podem ser pagos em até dez vezes.
Outra ponta visível dessa expansão está no segmento de cruzeiros, no qual a participação da Classe C na receita das empresas já é significativa.