E agora para algo um pouco diferente … Eu tive a sorte de visitar a bela cidade de São Paulo neste mês para conversar com os brasileiros sobre contabilidade na nuvem. Eu fiz uma palestra no SESCON/SP sobre tendências na contabilidade da nuvem, modelos de negócios emergentes e novas fontes de receita nos serviços contábeis.
Como todos os outros países do mundo, o Brasil também está passando pela transformação do software de contabilidade de desktop para a nuvem. As mesmas forças – digitalização, automação – estão no impulsionando esta jornada.
É surpreendente ver as semelhanças entre os contadores brasileiros e os da Austrália, Nova Zelândia, Canadá, Reino Unido e EUA.
E igualmente interessante para descobrir as diferenças. O tempo para essa mudança varia de acordo com o país, dependendo da maturidade dos fornecedores de software locais, das atitudes do governo e da qualidade do ecossistema empresarial.
Muito imposto
A maior diferença é, infelizmente, tem origem no topo do poder. A legislação fiscal foi tomada como refém pela classe política.
Os congressistas fazem pequenas mudanças para beneficiar um doador da campanha ou como uma recompensa pelo patrocínio. Por algumas estimativas, a legislação tributária brasileira muda a cada duas horas.
Existem impostos federais, estaduais e municipais que precisam ser observados, mas isso é apenas o começo. O imposto sobre mercadorias que atravessam fronteiras muda de acordo com os estados de origem e destino. Também pode depender do tipo de mercadoria (por exemplo, processado ou não processado), o tamanho da embalagem (a granel ou varejo) e quaisquer medidas para “suportar” uma determinada indústria. Isso pode chegar ao ponto de uma área geográfica dentro de um estado ter regras tributárias específicas.
A dupla tributação é comum e um custo aceito ao se fazer negócios. Um imposto enorme sobre os bens importados efetivamente dobra o preço dos carros de luxo e de todos os computadores. (Um MacBook Pro de 15 polegadas custa US $ 6.700 no Brasil e US $ 3.042 em San Francisco.)
Este mar cheio de leis tributárias, e a incerteza para todos os negócios que navegam nele, prejudicam o investimento estrangeiro. As multinacionais estão relutantes em investir se não puderem prever a quantidade de impostos que terão que pagar.
A complexidade gera muito trabalho e custa muito aos empresários. Eu ouvi de um executivo no Santander, um dos quatro grandes bancos brasileiros, os resultados de uma pesquisa comparando as obrigações fiscais globalmente. As empresas americanas, em média, exigem 120 horas por ano, enquanto as empresas brasileiras registram 2.600 horas, classificando o país como um dos piores do mundo.
O governo não é apenas hiperativo na aprovação de legislação. Também implementou uma iniciativa digital bastante radical chamada Sistema Público de Contabilidade Digital, conhecida pelo acrônimo português, SPED.
A peça central do SPED é uma solução de faturamento eletrônico para transações de empresa para empresa. Ao fazer uma venda, uma empresa deve enviar uma fatura eletrônica (NF-e) para o aprovação do governo que envia o documento eletrônico ao cliente. Mais uma vez, as empresas enfrentam severas penalidades se se atrevem a cortar o intermediário do governo.
Desta forma, o governo conhece a receita exata de cada empresa registrada.
Um consultor, palestrante e blogueiro, Roberto Dias Duarte, escreveu um pequeno livro detalhando como o SPED funciona. É chamado de “Big Brother Fiscal, o impacto em pequenas empresas brasileiras”, e está disponível em inglês.
Duarte usa uma metáfora divertida de porcos assados para descrever as insanidades do sistema fiscal brasileiro. Em suma, reformar o sistema ameaçaria muitos empregos e o status quo da ordem política. Então, o governo procura melhorias menores.
Nesta batalha contra a burocracia há um exército de 60 mil empresas de contabilidade. Os contadores precisam monitorar constantemente a volátil legislação para garantir que seus clientes estejam em conformidade com as regras. As autoridades tributárias tem ua fama de de distribuir fartas multas por erros, intencionais ou não.
Uma terra de honorários mensais fixos
O ambiente de negócios hostil dada a complexa conformidade legal criou (ironicamente) um modelo de negócios vantajoso para os contadores brasileiros. Toda empresa de contabilidade cobra de seus clientes um honorário fixo mensal para executar seus trabalhos. Ao contrário, na maioria dos países, os contadores cobram seus clientes por hora trabalhada.
Este modelo de preços traz como consequência que qualquer melhoria na eficiência no processo de conformidade aumentará suas margens de lucro dos prestadores de serviços contábeis. A boa notícia é que há uma série de empresas de software focadas em fazer exatamente isso!
Isso coloca os contadores brasileiros com uma vantagem distinta em relação aos colegas de outros países. Os contadores em qualquer outro lugar do mundo precisam abandonar a prática de faturamento por hora para viabilizarem a migração do modelos de negócios tradicional para o baseado em software em nuvem.
A complexidade legal também incentiva as empresas a investir na terceirização de processos de negócios (BPO). Este é um mercado promissor no Brasil
O contexto do software
Os contadores brasileiros ainda precisam entender como administrar suas empresas sem importar os dados de seus clientes para o software de processamento contábil e fiscal.
O mercado brasileiro ainda é dominado pelo software de contabilidade de desktop, embora iniciativa de soluções em nuvem estejam crescendo rapidamente. O maior em nuvem é a ContaAzul, com sede em Joinville, no sul do país. Possui 30 mil empresas que usam seu software de estilo ERP.
Outra nuvem ERP, Omie em São Paulo, tem pouco menos clientes (25.000). Mas o perfil de seus clientes é diferente: são empresas maiores, empresas e a o valor que eles pagam para usar o software é igualmente maior. Ambas as empresas pretendem automatizar ao máximo a conformidade legal para reduzir o peso de burocracia brasileira.
As integrações com serviços bancários são ações relativamente novas. A ContaAzul está realizando parcerias com os quatro maiores bancos brasileiros que detêm cerca de 80% de participação de mercado. Os integradores de dados bancários têm um grande desafio para coletar informações dos bancos brasileiros.
Ambos estão experimentando algoritmos para automatizar o processamento de transações em seu software. A Omie está prestes a lançar uma atualização que calculará automaticamente os impostos em uma nota fiscal de vendas antes de ser enviada ao governo para verificação.
Aplicativos conectados aos sistemas ainda estão em fase inicial de amadurecimento. Omie e ContaAzul têm menos de 10 cada um.
A oportunidade é enorme. Cerca de 80% das empresas estão controlando suas contas com o Excel ou caneta e papel. O software de contabilidade como um conceito nem existe na mente de muitos.
O futuro para contadores brasileiros
Na semana passada, apresentei novos modelos de negócios, como automatizar processos e obter novas fontes de receita. O público parecia muito receptivo e entusiasmado com os conceitos – mesmo com o meu pobre português.
Os contadores brasileiros ainda precisam entender como administrar suas empresas sem importar os dados de seus clientes para o software de processamento contábil e fiscal.
Mas isso só ganhará velocidade depois que uma massa crítica de clientes começar a se mover para a nuvem.
E isso pode demorar um pouco.
Enquanto isso, contadores inovadores e proativos estão procurando aplicativos estrangeiros. Um aplicativo que reduz várias horas trabalhadas para o cliente melhorará a rentabilidade de seus serviços (que têm honorários fixos).
Alguns contadores brasileiros poderiam visitar a Austrália e a Nova Zelândia para conversar com empresas líderes em nuvem.
Agradeço aos meus anfitriões, Marcelo Zetune e Marcio Massau Shimomoto do SESCON/SP, pelo convite.
Obrigado também ao Marcelo Lombardo de Omie e Vinicius Roveda Gonçalves na ContaAzul, por mostrarem-me o contexto do software de contabilidade em nuvens e ERP do Brasil.
Aprendi muitas coisas interessantes, fiz novos amigos e passei um ótimo período. O Brasil é um lugar maravilhoso e uma terra de pessoas maravilhosas. Estou ansioso para continuar a troca de experiências. Até logo!
*Sholto Macpherson is an online accounting software analyst and business technology journalist since 2000 and editor and publisher of Digital First. Sholto also writes about accounting technology for broadsheet newspapers, magazines in accounting associations, industry blogs and speaks regularly at accounting technology conferences, guest podcasts, and radio.